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Por que falar só em ‘cidade-esponja’ não é suficiente para evitar desastres
O conceito de cidades-esponja, desenvolvido na China, visa aumentar a capacidade de absorção de água das chuvas em áreas urbanas através de soluções baseadas na natureza. No entanto, especialistas defendem que essa abordagem deve ser ampliada para incluir zonas rurais, encostas e nascentes de rios. Analisar toda a bacia hidrográfica, e não apenas os centros urbanos, potencializa o projeto para minimizar os efeitos de eventos climáticos extremos, como os que ocorreram recentemente no Rio Grande do Sul.
Pesquisadores da Universidade de Pequim, incluindo Kongjian Yu, um dos pioneiros das cidades-esponja, afirmam que focar apenas nos centros urbanos pode ser ineficiente devido ao aumento das chuvas. Eles defendem a restauração da capacidade de absorção de água em toda a bacia hidrográfica, uma ideia detalhada no artigo “De Cidades Esponja para Bacias Hidrográficas Esponja”, publicado na revista Water. Kongjian Yu agora usa o termo “planeta-esponja” para descrever essa abordagem global.
No Brasil, a ideia tem ganhado apoio. Paulo Pellegrino, professor da FAU-USP, e Leila Teresinha Maranho, da UFPR, defendem que o conceito de cidade-esponja deve considerar tanto áreas urbanas quanto rurais, respeitando as áreas de preservação permanente ao longo das bacias hidrográficas. Porto Alegre, por exemplo, é influenciada pelo Lago Guaíba e seus afluentes, destacando a necessidade de uma abordagem de bacia hidrográfica-esponja.
Para implementar essa abordagem, é necessário conter ou reverter o desmatamento nas encostas, restaurar matas ciliares, manter a cobertura vegetal nas encostas e topos de morros, recompor planícies de inundação e adotar práticas de conservação do solo nas áreas agrícolas. Leila Maranho, que trabalha no projeto “Reserva Hídrica do Iguaçu” no Paraná, exemplifica como essas práticas podem ser aplicadas em áreas de serra para aumentar a vegetação e criar mais áreas de conservação.
As soluções baseadas na natureza, como jardins de chuva, parques lineares e restauração de encostas, são essenciais para tornar as cidades menos vulneráveis às mudanças climáticas. Essas soluções devem ser combinadas com a infraestrutura tradicional de engenharia, como diques, represas e sistemas de drenagem. Segundo Pellegrino, não é necessário descartar o que já foi feito, mas sim integrar novas técnicas para melhor absorção e retenção de água.
Kongjian Yu defende que devemos parar de “lutar contra a água” e adotar estratégias de absorção, desaceleração do fluxo e adaptação das cidades para áreas alagáveis. Essa abordagem é ilustrada pelo conceito de renaturalização dos cursos d’água e pela criação de áreas permeáveis para absorver a água das chuvas.
Embora o conceito de cidades-esponja tenha sido adotado com sucesso em algumas regiões, há críticas sobre sua capacidade de lidar com tempestades severas. O caso de Zhengzhou, que enfrentou uma forte inundação em 2021, destaca a necessidade de execução adequada e abrangente dos projetos. Além disso, a adaptação climática deve ser integrada às políticas de habitação e mobilidade para evitar impactos sociais negativos.
Expandir o conceito de cidade-esponja para incluir toda a bacia hidrográfica é crucial para enfrentar os desafios das mudanças climáticas. Além das ações governamentais, os cidadãos também podem contribuir utilizando seus jardins e telhados como “esponjas” para ajudar a absorver a água das chuvas, criando uma rede de mitigação dos impactos.